quinta-feira, junho 09, 2005

Coisas que melhoram algumas vidas

Viajar no 38 em hora de ponta, 38ºC lá fora e nenhuma agulha a bulir, o condutor nervoso do cansaço, soltando impropérios e insultando progenitoras alheias pela janela e buzinando, buzinando, buzinando aos carros que passam e a tudo o que se mova. Eu ensanduichado entre a comadre e seus sacos cheios de tupperwares e o compadre de cheiro a homem, o meu nariz nas suas axilas, sentindo caneladas e pisadelas (algumas propositadas, porque levo a guitarra às costas). "Vai sair?" - não, não ia sair - "Então com licença!" e uma carga de ombro. "Abra aqui atrás, faz favor!", "Até amanhã, se Deus quiser!" e "A culpa é do Santana!".
Mas finalmente, por meros segundos apenas, como que num castigo que não mereço ou numa obra perversa dos deuses, passar frente ao portão de saída do liceu Pedro Nunes, onde a vida é mais fácil e tudo é mais simples e fresco do que é dentro do autocarro, e ficar olhando, olhando, olhando pela janela para as peles queimadas, os decotes e os chinelos no pé, até dobrar a esquina, acordar, virar-me para a frente e massajar o pescoço.
"Saio aqui, se não se importa, deixava-me sair pela frente."
"Isso é que eu já não sei, amigo..." JB