terça-feira, novembro 01, 2005

Por um momento (IV)

Chegámos tarde demais à aula e encontrámos a porta trancada. Que raio...? Lembrámo-nos instantaneamente da nova política rigorosa quanto a atrasos e sorrimos entre-dentes. Olhámos pela janela. As pessoas abrigadas na paragem, sacudindo os guarda-chuvas, esperavam impacientes pelo autocarro, parado no trânsito, a poucos metros de distância.
Cansados demais para voltar para o bar, macambúzios demais para ir embora, aproveitámo-nos de ver o professor sozinho, esperando alguém, e ali ficámos a conversar. Não o víamos desde o ano passado.
- Esse guarda-chuva é um bocado maricas.
Olhei para o guarda-chuva que segurava, surpreso.
- O de ontem era mais, cheio de cores.
- Não deviam estar numa aula? - interrompeu.
Nenhum de nós respondeu.
- Que cara é essa? Desanimados?
- Elas não nos ligam.
Riu-se, como se não esperasse outra resposta de nós.
- Não desesperem... - disse-nos. E no jeito descomprometido que gosta de dar às palavras mais importantes, acrescentou - Há um mundo para salvar!
À saída da faculdade, o mesmo autocarro de há um bocado chegara finalmente à paragem.
- É o meu! Até amanhã!
Vi-o correr em passadas largas, enquanto se desembaraçava com o blusão para tapar a cabeça. Chegou tarde demais, bateu no vidro e as portas abriram-se num gesto simpático. Abotoei o casaco, olhei para as nuvens e inspirei o ar fresco e húmido. Ainda chove! Abri o guarda-chuva maricas e saí. JB