domingo, junho 12, 2005

Fi-lo, Sofia! (III)

Juntámo-nos no intervalo a seguir à aula de Matemática para discutir as propostas que íamos apresentar no Conselho Directivo: novos equipamentos para as salas de informática e audio-visuais, redes para as balizas do Pavilhão, um mapa de provas globais mais justo e folhados mais quentinhos no intervalo da manhã. A porca da Gisela decidiu ajavardar.
- E que tal propôr que o profe de Português dê aulas em tronco nu?
A proposta não conseguiu mais que a boa disposição do grupo e a aprovação de três raparigas bexigosas sedentas de sexo e do Nélson, O Homossexual. A minha irmã Mariana, que presidia à reunião, calou-os e começou a falar.
- Bem, todos sabem porque estamos aqui.
Silêncio na sala.
- Ninguém sabe porque estamos aqui?
Ninguém arriscou dizer nada. Olhei para o Rodrigão, O Alternativo. Estava a olhar para mim. Sorrimos, piscou-me o olho, cruzou os braços e voltou a prestar atenção à Mariana. Ele tinha acabado de me dar a deixa para uma ideia genial. Como era alternativo, amigo dos animais, fumava ganzas e até tinha rastas, de certeza que ia querer ir para a cama comigo depois do que eu ia dizer.
- Mariana, posso?
- Podes, Sofia.
Levantei-me e enchi-me de coragem.
- Bem, antes de mais, olá a todos.
- Olá, Sofia.
- Em primeiro lugar,
tenho um furúnculo na nalga esquerda.
- Põe Bepanthene.
- Em segundo lugar, proponho que se faça uma manif para salvar as árvores centenárias do pátio do liceu, que ouvi dizer que estão para ser abatidas para se construir um resort turístico no seu lugar. É uma vergonha, derivado a que as árvores são mais velhas que nós. Não temos o direito de lhes fazer isso! Penso que a camada do ozono é frágil e tem buracos, pois expelimos gases com CFC's para a atmosfera sem pensar nas consequências ao nível ambiental, nomeadamente o recuo dos glaciares e a destruição de espécies em vias de extinção. É cada vez mais necessária a intervenção das Organizações Não-Governamentais para, digamos assim, pôr cobro a esta situação.
A sala explodiu e levantou-se num aplauso. Sentia-me pequena, por momentos, no meio de tanta gente. Mas sentia-me bem! A minha irmã, no entanto, continuava sentada, a olhar para o lápis que segurava na mão.
- Então? Que te parece, Mariana?
- Não gosto da ideia. Eu sou uma mulher moderna, não vou muito nessas coisas de salvar as baleias.
- Duh! Não são baleias, são árvores centenárias,
Jorge.
- Eu não me chamo Jorge.
- Desculpa, Ricardo.
- Também não me...
- Aí vai o ganso!
- O quê?
- O ganso!
- Ah, o ganso. Aí vai o ganso!

Naquela noite dormi com o Rodrigão.


Fielmente Livremente interpretado dos episódios do Diário de Sofia, na RTP2. JB